Coisas

Quem tem um retrato meu guardado ? Uma roupa esquecida Ou a gravação de um áudio com " eu te amo" ? Quem lembra do meu perfume Dos objetos de uso pessoal ? Quem (além da minha memória ) Lembra da história que escrevi na sua vida ou lembra do meu endereço do meu jeito do meu comando da minha voz amando Quem ?

Double de cachorra

Nicole se foi em janeiro. Um luto sombrio na minha alma. " Adote outra cachorrinha '" Nem pensar. Eu triste. Fiz viagem. Chegava em casa, o chão frio sem pelo,sem latido. Apolo tinha partido fazia 2 anos. Só eu e as paredes. Tristeza virando doença. Neusa, tem uma cachorrinha aqui na clínica. Muito doce. Foi abandonada. Está castrada. Eu não queria saber, não. Fevereiro e eu na minha caminhada solitária, resolvi entrar na clínica. Passando em frente mesmo. Era um feriado,eu acho. Só tinha a faxineira na clínica. - Oi ! - A clínica está fechada. Só estou limpando. - Vim ver a cachorrinha Os olhos da faxineira brilharam tanto de alegria. - Entra! Entra! E lá debaixo veio numa disparada a Princesa. A cara da Nicole! Meu coração encheu de alegria. Voltei com ela pra casa. Ninguém acreditava! Outra cachorra? Outro sofrimento? Engano! A princesa devolveu a saúde da minha alma. Ocupou o lugar da Nicole. Adotar foi uma experiência gozada. Excêntrica. Medicamentosa. Depois + tarde , ou logo no mês seguinte, a Pretinha pra fazer companhia . Que cachorro sozinho é ruim. Pronto. Parei de sofrer. Foi a minha cura. A Princesa era a cara da Nicole ,cor , porte e pelagem. Só as orelhas são diferentes. Depois disso eu percebi porque a Natureza tem raças caninas : para um poder ficar no lugar do outro. Ser "double " daquele que perdemos.

Anjo de Asa Torta

Feriado. Há um silêncio no bairro. O vizinho que era problema se mudou. Era um desorientado. Gritava muito alto com a mãe. Moravam no sobradinho da frente. Vinham discutir na sacada, como se a sacada fosse um espaço particular. As vozes cheias das ameaças vibravam no vento. A rua toda ouvia. A polícia foi chamada algumas vezes. O clima acalmava. Um dia arrumou emprego, criou jeito na vida. Continuou vizinho. Os gritos já não assustavam . Era o tom genético da família. Mas foi esse "vizinho problema " que me socorreu quando precisei de um chaveiro para entrar em casa. Era noite alta, ele na sacada , eu presa na área externa de serviço. Eu gritei , ele ouviu. Mandou um chaveiro para mim. Existem pessoas assim : anjos da guarda , com asas tortas. Da minha sacada , ontem, eu bradei : vai com Deus. E meu coração ficou apertado. Eu não esqueço de quem me salva. (vizinho , bom vôo!)

Mulher brava

De repente,dou de cara com a postagem do curso sobre a "Infelicidade nos clássicos" ou" ninguém é feliz o tempo todo". De fato, tendemos a registrar apenas os momentos alegres e divertidos. Por que não registramos e não fazemos selfie quando estamos chorando, sofrendo, com a seguinte legenda : " eu estou sofrendo!" " que merda foi o meu dia! " Por que ninguém quer aparecer quando está triste? Será vergonha de ser humano e vulnerável ? É humilhante ficar triste? Hoje o meu dia foi 5 , mais a noitinha pulou para 7,5 e somente, agora, quase duas da manhã, foi para 10. Destilei as angústias, coloquei as coisas no lugar,estou relativamente bem. Perdi até o sono. Mas dei pau na tristeza. Ela existe, ela é foda, mas a gente conversa e ela vai embora. Aqui ela não dorme. Aqui tem mulher brava.